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Guardiães do farol da verdade

Redação (Terça-feira, 25-06-2019, Gaudium Press) Um navio de guerra se encontra em manobras no alto-mar. É noite. 

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O oficial responsável informa ao capitão que estão em curso de colisão com outro barco, cujas luzes podem ser vistas no horizonte. Então, o capitão ordena enviar uma mensagem pelo rádio:

– Estamos em curso de colisão com os senhores. Modifiquem sua rota em vinte graus.

Do outro lado respondem:

– Aconselhamos-lhes que sejam os senhores os que alterem o rumo.

O comandante retruca rispidamente:

– Aqui fala o capitão. Somos um navio de guerra. Quem são vocês?

Eles respondem:

– Somos simples marinheiros.

O capitão, furioso e mais incisivo, diz:

– Então sigam as minhas instruções!

Um dos marinheiros exclama:

– Infelizmente é aos senhores que cabe mudar urgentemente seu curso. Nós somos um farol!

 

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Vossa posição se parece à do guardião do farol

Essa singela história contém um profundo significado, e por isso iniciei com ela minhas palavras. Trata-se de uma imagem da grandeza e beleza da vocação sacerdotal pois, à semelhança dos marinheiros que cuidavam daquele farol, os presbíteros são chamados a agir sobre o curso da vida dos homens, seja para o manter ou modificar.

Caríssimos ordenandos, vossa posição se parece à do guardião do farol. Por todas as partes navegam hoje embarcações diversas: vapores de luxo cujos passageiros desejam apenas se divertir, esquecidos do amor a Deus; navios de guerra, canhoneiros e barcos destruidores, que procuram afundar o vosso navio; por fim, submarinos dirigidos por católicos, que sobem à tona somente nas cerimônias de Batismo e funerais, permanecendo ocultos o resto do tempo.

E vemos, de outro lado, os marinheiros do farol, que não possuem a força midiática dos torpedeiros para falar de si, nem, menos ainda, a dos navios de guerra. Não, sua força não reside nos meios externos de poder. Graças a Deus, pois assim estão livres da tentação de os utilizar.

Eles não dirigem o curso da vida pelo ímpeto dos canhões, nem orientam os homens mediante coação. Pelo contrário, conduzem a trajetória dos navios da vida de forma semelhante à atuação dos marinheiros de nossa história: simplesmente anunciam a Verdade Encarnada, Nosso Senhor Jesus Cristo.

Considerai que os sacerdotes não são fortes por si mesmos, mas adquirem força na medida em que dão testemunho da verdade. E devem agir como o guarda do farol: mostrar aos navios onde se encontram a terra e o mar, e aconselhar a todos, inclusive ao capitão que se julga no direito de determinar ao marinheiro sua rota de navegação, a seguir suas indicações.

Anunciadores da Palavra e administradores dos Sacramentos

Com os homens acontece o mesmo. Eles não alteram seu curso apenas por causa da personalidade do marinheiro, e nem devem fazê-lo. Aqueles que são sensatos só mudam de rumo ao entrar em contato com a verdade do Evangelho, revelado por Deus e confiado à sua Igreja.

A Igreja não pode senão proclamar essa verdade, oportuna ou inoportunamente. E vós, caríssimos ordenandos, vos deparareis no futuro com situações similares à dos marinheiros do farol. Escutareis ordens de capitães autênticos e de capitães autonomeados. E será preciso dar-lhes sempre a resposta simples dos marinheiros: vós podeis e deveis anunciar a beleza e a verdade da Fé. Nada mais. Não vossas sábias opiniões, por mais úteis que pareçam, mas sim a verdade sobre Deus e a salvação eterna. Ela mostrará aos homens o caminho certo.

Vós sois anunciadores da Palavra, servos que administram os Sacramentos ao longo das traiçoeiras e difíceis sendas da vida. Deveis, como os guardiães do farol, advertir os navegantes sobre os perigos e obstáculos do caminho, anunciando a Palavra da salvação e não teorias ou ideias por vós forjadas. E quando administrardes os Sacramentos, saibais que sua força e eficácia não vêm de vós, mas deles próprios, do mesmo modo que o marinheiro não criou os rochedos sobre os quais está construído o farol em que se encontra.

Desastres acontecem quando se abandona o farol

Para todos nós, caríssimos irmãos e irmãs, isso significa que não devemos procurar no sacerdote uma personalidade excepcional – que talvez nem exista -, nem considerar principalmente suas qualidades humanas. O sacerdote nos oferece algo que não provém deste mundo.

Estimados ordenandos, ao vos compenetrardes dessa verdade, impregnareis com ela vosso caminho futuro. Se estiverdes convictos de que podeis e deveis indicar aos homens seu curso, mediante o anúncio da Palavra de vida de Nosso Senhor Jesus Cristo, não atribuireis a vós mesmos o sucesso quando ele se apresentar. Então vos posicionareis atrás de vosso chamado, sem aparecer nas manchetes das notícias, como o marinheiro do farol.

Este seria notícia apenas se abandonasse seu posto para ocupar-se com outras coisas. Quando os marinheiros abandonam o farol, acontecem os desastres e logo aparecem as manchetes. Do mesmo modo, quando os sacerdotes e os Bispos já não têm a coragem de anunciar com força o Evangelho, mas proclamam suas próprias opiniões, então ocorrem os desastres e se multiplicam as manchetes. Não é o que fartamente presenciamos nos últimos tempos? Aquele que deseja inventar uma nova Igreja e modificar, por assim dizer, seu DNA, está no caminho errado e abusa de sua autoridade espiritual.

Vossa missão requer humildade e coragem

Caríssimos ordenandos, subi ao vosso farol, conscientes de que vossa vocação sagrada não consiste em chamar atenção sobre vós mesmos. Não se espera de vós que inventeis algo novo para salvar a Igreja, mas que mostreis Jesus Cristo. Isso exige humildade, e não menor coragem.

Permanecer sobre a rocha e anunciar a Palavra de Deus requer enorme força, além de uma sadia e robusta convicção de vossa missão. Sejam palavras elogiosas ou desafiantes, dizei-as com ufania, mais do que quando falais em vosso próprio nome. Sede conscientes de que tendes uma dignidade que vos diferencia de todos aqueles que não são sacerdotes. Contudo, não adquiristes essa dignidade por vós mesmos. Estai convictos de que possuís algo grandioso e eterno.

Desejo-vos que assumais essa vocação de todo o coração. Desejo-vos, ao mesmo tempo, a coragem e a humildade de dizer e fazer somente aquilo que deve ser dito e feito em nome de Jesus Cristo, de não confiar nas próprias qualidades, mas na Palavra a vós entregue e na certeza de que tendes algo a anunciar que ultrapassa o humano, pois toca no divino.

O sacerdócio não é simplesmente um ofício, mas um Sacramento. Deus Se serve de um mero homem para, através dele, fazer-Se presente entre os homens e neles agir.

Estimados ordenandos, se viverdes dessas convicções e agirdes em função delas, jamais perdereis a coragem nem sereis presunçosos, mas agradecereis, de todo o coração, a experiência – da qual já vos beneficiais – de serdes sustentados e dirigidos por Aquele que vos chamou para seu santo serviço: Jesus Cristo, o Filho ressurrecto do Deus vivo!

(Homilia durante a ordenação de quatro novos presbíteros na Abadia de Heiligenkreuz, Áustria, em 27/4/2019 – Tradução e adaptações: Pe. Antonio Jakoš Ilija, EP)

 

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