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A misericórdia atraiu o maior milagre da História

Redação – (Sexta-feira, 17-04-2015, Gaudium Press) – Após o pecado original, a humanidade havia contraído uma dívida com o Criador. Normalmente, quando alguém deve determinada quantia a outrem, paga-lhe exatamente o débito ou, às vezes, devolve-lhe com juros. Porém, como poderia o homem, finito como é, satisfazer o Infinito? Só mesmo alguém Infinito poderia oferecer, com idêntica dignidade, a paga ao Deus infinito, em lugar dos homens finitos: este foi precisamente o motivo da Encarnação de Jesus Cristo. (1)Menino-Jesus_Arautos.jpg

Entretanto, consideremos um pouco a amplitude de tal satisfação, que manifesta um grande amor de Deus para conosco e um reflexo tão alto do poder divino que escapa completamente tanto à cogitação humana quanto à angélica, (2) pois, “[…] ao Se encarnar no seio puríssimo de Maria, Nosso Senhor fez o milagre negativo de assumir um corpo padecente”. (3) Eis o mistério que pasma toda criatura: Ele veio à nossa humanidade, sem deixar a divindade, para ser imolado no Sagrado Madeiro e, assim, comprar e reatar nossa amizade com Deus!

De fato, milagre é aquilo que faz Deus, cuja causa nos é oculta. (4) Muitas vezes, é a transformação de algo pequeno, ou até insignificante, em obra de grande valor. Por exemplo, ninguém prestava muita atenção no coxo que ficava à Porta Formosa do Templo pedindo esmolas (cf. At 3, 1-2). Supomos que as pessoas deviam, de vez em quando, se compadecer e dar-lhe algum óbolo. Mas, poucos anos depois de sua morte, quem se lembraria dele? Decerto, a História não conheceria jamais sua existência se um dia não tivesse sido alvo do retumbante milagre de voltar a andar, pela virtude do nome de Jesus (cf. At 3, 6-9). Digamos ter sido este um milagre “positivo”.
Mas o que seria fazer um milagre “negativo”? Seria como se o mesmo coxo fosse um homem atlético, ativo e de muito bom porte físico e, certo dia, um dos Apóstolos, olhando bem para ele, ordenasse o “milagre” de instantaneamente ficar deficiente. Chamaríamos isto de desgraça, pois é algo negativo, e nunca de prodígio.

Ora, Nosso Senhor Jesus Cristo quis assumir sobre Si, por sua misericórdia infinita, as deficiências corporais da natureza humana (5) e assim lavar-nos da infelicidade do pecado. Paradoxo maior não há, por ser Ele o Inocente! É o que a Deus aprouve fazer por nós: “Se encarnou pela nossa salvação” (Dz 40), “realizando um milagre contra Si mesmo, pois preferiu tomar um corpo padecente”, (6) àquele que pela sua vida na glória não podia padecer!

O que a misericórdia do Todo-Poderoso não é capaz de fazer! Quanto poder!

Já houve muitos milagres na História, sempre para melhor; porém, para o ínfimo, e não para com outros, mas para consigo mesmo, só Um teve coragem de fazer, com o fim de resgatar os que Ele ama.

A humildade foi assumida pela Majestade, a fraqueza, pela Força, a mortalidade, pela Eternidade. Para saldar a dívida de nossa condição humana, a natureza impassível uniu-se à natureza passível. […] Assumiu a condição de escravo, sem mancha de pecado, engrandecendo o humano, sem diminuir o divino. Porque o aniquilamento, pelo qual o invisível se tornou visível, e o Criador de tudo quis ser um dos mortais, foi uma condescendência de sua misericórdia, não uma falha do seu poder. […] Entrou, portanto, o Filho neste mundo tão pequeno, descendo do trono celeste, mas sem deixar a glória do Pai; é gerado e nasce de modo totalmente novo. De modo novo porque, sendo invisível em si mesmo, torna-se visível como nós; incompreensível, quis ser compreendido; existindo antes dos tempos, começou a existir no tempo. O senhor do universo assume a condição de escravo, envolvendo em sombra a imensidão de sua majestade; o Deus impassível não recusou ser homem passível, o imortal submeteu-se às leis da morte. […] Contudo, nem Deus sofre mudança com esta condescendência da sua misericórdia nem o homem é destruído com sua elevação a tão alta dignidade. (7)

Por Ir. Mariana de Oliveira, EP
(Do Instituto Filosófico Teológico Santa Escolástica)

1 Cf. SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica III, q. 1, a.2, ad 2.
2 Cf. CLÁ DIAS, João Scognamiglio. A fé de Pedro, fundamento do Papado. In: O inédito sobre os Evangelhos. Comentários aos Evangelhos dominicais do Tempo Comum. Ano A. Città del Vaticano-São Paulo: LEV; Lumen Sapientiae, 2013, v. II, p. 291.
3 Ibid. p. 292.
4 Cf. SÃO TOMÁS DE AQUINO. Op. cit. I, q.105, a.7.
5 Cf. Ibid. III, q.5, a.3
6 CLÁ DIAS, João Scognamiglio. O triunfo, a cruz e a glória. In: O inédito sobre os Evangelhos. Comentários aos Evangelhos dominicais. Advento, Natal, Quaresma e Páscoa. Solenidades do Senhor que ocorrem no Tempo Comum. Ano A. Città del Vaticano-São Paulo: LEV; Lumen Sapientiae, 2013, v. I, p. 259.
7 SÃO LEÃO MAGNO. Cartas. In: COMISSÃO EPISCOPAL DE TEXTOS LITÚRGICOS. Liturgia das Horas. Op. cit. v. II, p. 1506-1507.

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