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Mons. João Clá: Pentecostes

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Redação (Sexta-feira, 13/05/2016, Gaudium Press) – Formamos um só corpo, e todos nós bebemos de um só Espírito” (1 Cor 12, 13).

Quem é o Espírito Santo, como foram as circunstâncias e quais as principais graças concedidas a Maria e aos discípulos por ocasião de Pentecostes?

Eis os ensinamentos que a Liturgia nos coloca à disposição, fazendo-nos compreender onde se encontra a verdadeira paz.

Evangelho

19 Chegada a tarde daquele mesmo dia, que era o primeiro da semana, e estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam juntos, por medo dos judeus, foi Jesus, colocou-Se no meio deles e disse-lhes: “A paz esteja convosco!” 20 Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos alegraram-se muito ao ver o Senhor. 21 Ele disse-lhes novamente: “A paz esteja convosco. Assim como o Pai Me enviou, também vos envio a vós”. 22 Tendo dito estas palavras, soprou sobre eles e disse-lhes: “Recebei o Espírito Santo. 23 Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados, àqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos” (Jo 20, 19-23).

I – A IGREJA POR OCASIÃO DE PENTECOSTES

Oração numa atmosfera de harmonia e concórdia

Como outras tantas festas litúrgicas, Pentecostes nos faz recordar um dos grandes mistérios da fundação da Igreja por Jesus. Encontrava-se ela em estado ainda quase embrionário – alegoricamente, poder-se-ia compará-la a uma igreja de sao roque.jpgmenina de tenra idade – reunida em torno da Mãe de Cristo. Ali no Cenáculo, conforme nos descrevem os Atos dos Apóstolos na primeira leitura, passaram-se fenômenos místicos de excelsa magnitude, acompanhados de manifestações sensíveis de ordem natural: ruído como de um vento impetuoso, línguas de fogo, os discípulos exprimindo-se em línguas diversas sem tê-las antes aprendido. A alta significação simbólica do conjunto desses acontecimentos, como de cada um em particular, constituiu matéria para inúmeros e substanciosos comentários de exegetas e teólogos de grande valor, como se torna claro por anteriores observações feitas por nós em artigo publicado em 2002 (1). Hoje, cabe-nos ressaltar outros aspectos de não menor importância correlacionados com a narração feita por São Lucas (At 2, 1-11), para assim melhor entender o Evangelho em questão e, portanto, a própria festividade de Pentecostes.

Enquanto figura exponencial, destaca- se Maria Santíssima, predestinada desde toda a eternidade a ser Mãe de Deus. Dir-se-ia que havia atingido a plenitude máxima de todas as graças e dons, entretanto, em Pentecostes, mais e mais Lhe seria concedido. Assim como fora eleita para o insuperável dom da maternidade divina, cabia-Lhe o tornar-se Mãe do Corpo Místico de Cristo e, tal qual se deu na Encarnação do Verbo, desceu sobre Ela o Espírito Santo, por meio de uma nova e riquíssima efusão de graças, a fim de adorná-La com virtudes e dons próprios e proclamá-La “Mãe da Igreja”.

Em seguida estão os Apóstolos; constituem eles a primeira escola de arautos do Evangelho. Observavam as condições essenciais para estarem aptos à alta missão que lhes destinara o Divino Mestre, conforme nos relata a Escritura: “Todos estes perseveraram unanimemente em oração, com algumas mulheres e com Maria, Mãe de Jesus, e com os seus irmãos” (At 1, 14).

Essa perseverança na oração se realizou de forma continuada e no silêncio, na solidão e clausura do Cenáculo. A atmosfera era de máxima concórdia, harmonia e união entre todos, de verdadeira caridade fraterna. São Lucas em seu relato faz questão de realçar a presença de Maria, certamente para tornar patente o quanto Ela mesma se alegrava em ser uma fiel participante da Comunidade. Uma nota marcante é a submissão e obediência ao Vigário de Cristo tal qual transparece nos versículos subsequentes, ao relatarem o primeiro ato de governo e jurisdição de São Pedro (At 1, 15-22).

Em síntese, a verdadeira eficácia do apostolado está aí evidenciada, sob o manto da Santíssima Virgem, na união efetiva e afetiva de todos com a Pedra sobre a qual Cristo edificou sua Igreja.

A eficácia da ação encontra-se na contemplação

Esse grande acontecimento foi precedido não só dos dez dias de oração contínua, mas também de muitos outros momentos de recolhimento. O trauma havido por ocasião da dramática Paixão do Salvador exigia horas e horas de isolamento e reflexão. Ademais, o temor de novas perseguições e traições impunha-lhes prudência, além do abandono das atividades comuns do apostolado anterior.

Curiosamente, em geral, Cristo Ressurrecto escolhia oportunidades como essas – de reflexão e compenetração da parte de todos – para lhes aparecer, assim como o Espírito Santo para lhes infundir seus dons. Esta é uma importante lição que a Liturgia de hoje nos oferece: a verdadeira eficácia da ação encontra-se na contemplação. O próprio Apóstolo por excelência, que chegou a exclamar: Vae enim mihi est, si non evangelizavero! – “Ai de mim se eu não evangelizar!” (I Cor 9, 16), passou um longo período de oração no deserto a fim de preparar-se para a pregação.

Quem toma o trabalho de analisar passo a passo as atividades de um varão zeloso e apostólico pode vir a equivocar- se julgando serem elas puro fruto de sua personalidade empreendedora, ou de seu caráter dinâmico, ou até mesmo de sua constituição psicofísica. São numerosos os homens operantes e profícuos que arrancam de seu ser o inimaginável. Onde se encontram, de fato, as energias empregadas por esses leões da fé e da eficiência? Mais ainda poderíamos nos perguntar: como conseguem eles, em meio à avalanche de atividades, conservar um coração brando e suave no trato com os outros?

Lembremo-nos do conselho dado por São Bernardo de Claraval ao papa da época, Eugênio III: “Temo que em meio de tuas inumeráveis ocupações te desesperes de não poder levá-las a cabo e se endureça tua alma. Obrarias com cordura abandonando-as por algum tempo para que elas não te dominem nem te arrastem para onde não quiseras chegar. Talvez me perguntes: ‘Aonde?’ (…) Ao endurecimento do coração. Aí vês para onde te podem arrastar essas ocupações malditas se continuas entregando-te a elas totalmente, como até agora, sem reservar nada para ti” (2).

Trata-se de um Doutor da Igreja aconselhando o Doce Cristo na terra daqueles tempos, no exercício da mais alta função: o governo dessa instituição divina. Pois bem, segundo seu parecer, tão elevadas ocupações, sem o auxílio da vida interior, são malditas. Essa sempre foi a postura de alma dos santos, espiritualistas e Padres da Igreja. Santo Agostinho afirma, por exemplo: “Todo apóstolo, antes de soltar a língua, deve elevar a Deus com avidez sua alma, para exalar o que deva, e distribuir sua plenitude” (3).

Feitas essas considerações emergentes da primeira leitura (At 2, 1-11) encontramo-nos mais aptos para contemplar as belezas do Evangelho da presente Liturgia.

II – O EVANGELHO DA SOLENIDADE DE PENTECOSTES

19 Chegada a tarde daquele mesmo dia, que era o primeiro da semana, e estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam juntos, por medo dos judeus, foi Jesus, colocou-Se no meio deles e disse-lhes: “A paz esteja convosco!”

A prova pela qual haviam passado os Apóstolos excedia as forças da frágil natureza humana e, apesar do testemunho entusiasmado de Maria Madalena, não lhes era fácil crer na Ressurreição; talvez seu abatimento fosse o resultado de não se julgarem dignos de receber uma aparição do Senhor, segundo pondera São João Crisóstomo, devido ao horroroso abandono no qual deixaram o Mestre em sua agonia.sao bernado.jpg

Na sua bondade infinita, Jesus não deixou transcorrer muito tempo para se manifestar também a eles. Escolheu uma excelente oportunidade para tal: no entardecer e estando as portas fechadas, para tornar ainda mais patente a grandeza do milagre de sua Ressurreição.

A chegada da noite é o momento em que a apreensão cresce no interior de todos os temerosos. Por outro lado, penetrar num recinto com portas e janelas fechadas, só mesmo em corpo glorioso poderia alguém realizar tamanho prodígio.

Qual seria o lugar onde estavam reunidos, não se sabe com exatidão. A hipótese mais provável recai sobre o Cenáculo.

Outro particular interessante é a posição escolhida por Cristo para lhes dirigir a palavra. Ele poderia ter preferido saudá-los logo à entrada, entretanto caminhou entre eles e foi colocar- Se bem ao centro. Esse deve ser sempre o posto de Jesus em todas as nossas atividades, preocupações e necessidades. O deixá-Lo de lado, além de ser falta de respeito e consideração, é condenar ao fracasso qualquer iniciativa, por melhor que seja. Sua saudação também nos chama especialmente a atenção: “A paz esteja convosco”.

À primeira vista seríamos levados a julgar compreensível que Ele desejasse acalmá-los das perturbações que os acometiam desde a prisão no Horto das Oliveiras. E de fato, esse bem poderia ser um de seus intentos, mas o significado mais profundo não reside nessa interpretação. Para melhor o entendermos, perguntemo-nos o que é paz.

“Paz é a tranquilidade da ordem”, diz Santo Agostinho (4), ou seja, uma ordem permanentemente tranquila. E São Tomás demonstra ser a paz efeito próprio e específico da caridade, pois todo aquele que está em união com Deus vive na perfeita ordem, ao harmonizar todas as suas potências, sentidos e faculdades à sua causa eficiente e final (5). Essa união faz brotar na alma que a possui um profundo repouso interior e nem sequer os inimigos externos a perturbam, porque nada lhe interessa a não ser Deus: “Se Deus está conosco, quem será contra nós?” (Rom. 8, 31). Ora, sabemos pela Teologia que o Espírito Santo é a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade e procede do Pai e do Filho por via do Amor. N’Ele está a raiz, ou semente, da qual nasce o fruto da caridade. Ao amarmos a Deus e ao próximo, a alegria e o consolo penetram em nosso interior. Desse amor e gozo, procede a paz (6). Jesus, desejando-lhes a paz, oferecia-lhes um dos principais frutos desse Amor infinito que é o Espírito Santo.

20 Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos alegraram-se muito ao ver o Senhor.

Por esta atitude do Senhor podemos bem avaliar o quanto o pavor havia penetrado na alma de todos, apesar de ouvirem a voz do Divino Mestre desejando-lhes a paz.

Por isso tornou-se indispensável mostrar-lhes aquelas mãos que tanto haviam curado cegos, surdos, leprosos e inúmeras outras enfermidades, mãos que talvez eles mesmos tivessem, a seu tempo, osculado. Sim aquelas mãos que, havia pouco, tinham sido transpassadas por terríveis cravos. Era preciso comprovarem tratar- se do Redentor, vendo seu lado perfurado pela lança de Longinus.

Naquele momento sentiram a alegria pervadir suas almas, pois constataram não estar diante deles um fantasma, mas sim o próprio Jesus em Corpo, Sangue, Alma e Divindade. Cumpria-se assim sua promessa: “Hei de ver-vos de novo, e o vosso coração se alegrará, e ninguém vos tirará a vossa alegria” (Jo 16, 22).

Transparece nessa atitude seu profundo intuito apologético, ao fazê-los ver suas Santas Chagas, ao contrário de como procedera com Santa Maria Madalena, ou até mesmo com os discípulos de Emaús.

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Outra nota de bondade consiste no fato de Ele ter velado o esplendor de seu Corpo glorioso, caso contrário a natureza humana dos Apóstolos não teria suportado o fulgor da majestade do Homem-Deus ressurrecto.

21 Ele disse-lhes novamente: “A paz esteja convosco. Assim como o Pai Me enviou, também vos envio a vós”.

Novamente Jesus lhes deseja a paz, e deixa assim entrever quão importante é a tranquilidade da ordem. Como objetivo imediato, visava Jesus proporcionar-lhes a indispensável serenidade de espírito face às desavenças e mortais perseguições que lhes moveriam os judeus. Por outro lado, Jesus se dirige aos séculos futuros e, portanto, à própria era na qual vivemos. Também a nós Ele nos repete o mesmo desejo de paz formulado aos Apóstolos naquele momento. Sim, especialmente à nossa civilização que tem suas raízes em Cristo – Rei, Profeta e Sacerdote – cuja entrada neste mundo fez-se sob o belo cântico dos Anjos: “Paz na terra” (Lc 2, 14). Não foi outro o dom por Ele oferecido antes de morrer na Cruz, ao despedir-se: “Dou-vos a paz, deixo-vos minha paz” (Jo 14, 27).
Entretanto, a humanidade hoje se suicida em guerras, terrorismos e revoluções. E qual a causa? Não queremos aceitar a paz de Cristo.

Tal qual a caridade, a paz começa na própria casa. Antes de tudo, é preciso construí-la dentro de nós mesmos, dando à razão iluminada pela Fé o governo de nossas paixões. Sem essa disciplina, entramos na desordem. Ora, vai se tornando cada vez mais raro encontrar- se um ser humano no qual esse equilíbrio é procurado com base no esforço e na graça. O espontaneísmo domina despoticamente em todos os rincões. Vivemos os axiomas da Sorbonne de 1968: “É proibido proibir” – “A imaginação tomou conta do poder” – “Nada reivindicar, nada pedir, mas tomar, invadir”. Eles pareciam ser para a humanidade uma pedra filosofal de felicidade, sucesso e prazer… Que desilusão!

A paz deve ser a condição normal e corrente para o bom relacionamento social, sobretudo na célula mater da sociedade, a família. Eis um dos grandes males de nossos dias: a autoridade paterna se autodestruiu, a sujeição amorosa da mãe se evanesceu e a obediência dos filhos foi carcomida pelo capricho, desrespeito e revolta. Essas enfermidades morais, transpostas para a vida da sociedade, redundam em luta civil, de classes e até mesmo entre os povos.

A humanidade sofre essas e muitas outras consequências do pecado de ter repudiado a paz de Cristo e abraçado a paz do mundo, ou seja, o consumismo, o igualitarismo, o laicismo, a adoração da máquina, etc.

Sentencia a Escritura: “Não há paz – diz Javé – não há paz para os ímpios” (Is 57, 20). “Curavam as chagas da filha do meu povo com ignomínia, dizendo: Paz, paz; quando não havia paz” (Jer 6,14). Os milênios transcorreram e nos encontramos novamente na mesma perspectiva de outrora, com uma agravante: corruptio optimi pessima (a corrupção do ótimo resulta no péssimo). Sim, a rejeição da paz verdadeira trazida pelo Verbo Encarnado é muito pior do que a impiedade antiga, e de consequências ainda mais drásticas.decida do espirito santo.jpg

A ordem fundamental do edifício da paz deriva essencialmente do Evangelho e do Decálogo, ou seja, do amor a Deus sobre todas as coisas e ao próximo por amor a Ele (7). Daí floresce a paz interior do homem e a harmonia com todos os outros, amados por ele com real caridade. Esse é o melhor remédio para todos os males atuais, desde a “epidemia” das depressões – enfermidade paradigmática de nosso século – até o terrorismo. É indispensável reconhecermos em Deus nosso Legislador e Senhor, pois, se ao longo da vida não existir a moral individual nem a familiar, haverá menos ainda o verdadeiro equilíbrio social e internacional. O caos de nossos dias no-lo demonstra em demasia.

Sendo a paz fruto do Espírito Santo, fora do estado de graça, e da prática da caridade, não nos é dado encontrá-la. Por isso quem se torna empedernido no pecado não pode gozar da paz: “Mas os malvados são um mar proceloso que não pode aquietar-se e cujas ondas revolvem lodo e lama. Não há paz – diz Javé – para os ímpios” (Is 57, 20).

O mesmo Isaías nos proclama a prodigalidade e a grandeza da bondade de Deus para com os justos: “Porque assim diz Javé: Vou derramar sobre ela (Jerusalém) a paz como um rio, e a glória das nações como torrentes transbordantes” (Is 66, 12).

Essa é a razão mais específica do fato de Jesus ter desejado uma segunda vez a paz a seus discípulos. É Ele o autor da graça e, portanto, o autor da paz: “Cristo é a nossa paz” (Ef 2, 14). “A graça e a verdade foram trazidas por Jesus Cristo” (Jo 1, 17).

Após esse segundo voto de paz, Jesus envia seus discípulos à ação, tornando claro o quanto é necessário jamais se deixar tomar pelo afã dos afazeres, perdendo a serenidade. Um dos elementos essenciais para o apostolado bem-sucedido é a paz de alma de quem o faz.

Outro importante aspecto a considerar neste versículo é a afirmação do princípio da mediação tão do agrado de Deus. Jesus se apresenta aqui como o Mediador Supremo junto ao Pai e, ao mesmo tempo, constitui os Apóstolos como mediadores entre o povo e Ele. Aqui podemos medir quanto são enganosas as máximas igualitárias ao procurarem destruir o senso de hierarquia.

22 – Tendo dito estas palavras, soprou sobre eles e disse-lhes: “Recebei o Espírito Santo”.

Na festa de hoje se comemora a descida do Espírito Santo sobre Maria e os Apóstolos a qual se encontra tão bem narrada na primeira leitura (At 2, 1-11). Esse acontecimento deu-se depois da subida de Jesus ao Céu e talvez daí decorre o fato de alguns negarem a realidade do grande mistério operado por Ele na ocasião, narrada no versículo em análise. Esse erro, mais explícito no começo do séc. VI, foi solenemente condenado pela Igreja no V Concílio Ecumênico de Constantinopla, em 552: “Se alguém defende o ímpio Teodoro de Mopsuestia, que disse (…) que depois da Ressurreição, quando o Senhor insuflou sobre os discípulos e lhes disse ‘Recebei o Espírito Santo’ (Jo 20, 22), não lhes deu o Espírito Santo, senão que tão-só o deu figurativamente (…), seja anátema” (8).

O Espírito Santo não procede somente do Pai, mas também do Filho. Ele é o Amor entre ambos. E como definir o amor? É muito mais fácil senti- lo do que defini-lo. Dois amigos que muito se querem, ao se encontrarem depois de longo período de separação, se abraçam fortemente e cheios de alegria. O que significa esse gesto tão espontâneo e efusivo, senão a manifestação de um amor recíproco? Os dois quase desejam, nessa hora, uma fusão de seus seres. O interior das mães se desfaz, suas entranhas parecem estar sendo arrancadas ao verem seus filhos partirem. Os que se amam querem estar juntos e se olhar. E quanto mais robusto é o amor, maior será a inclinação de se unirem.

Ora, quando os dois seres que se amam são infinitos e eternos, jamais esse impulso de união poderá manterse dentro dos estreitos limites de uma mera tendência emocional, como muitas vezes se passa entre nós homens. Entre o Pai e o Filho, esse Amor é tão vigoroso que faz proceder uma Terceira Pessoa, o Espírito Santo.

Nossos amores, em não raras circunstâncias, são volúveis. Deus, muito pelo contrário, porque se contempla a Si próprio, Bom, Verdadeiro e Belo, eterna e irresistivelmente, Se ama desde todo o sempre e para sempre, e, tal qual assevera Santo Agostinho, desse amor faz proceder uma Terceira Pessoa infinita, santa e eterna, o Divino Espírito Santo. O amor é eminentemente difusivo e por isso tende a comunicar- se, a entregar-se. Curiosa é a diferença de forma empregada por uma e outra Pessoa para se comunicar com os homens.confessionario.jpg

O Filho veio a este mundo assumindo nossa natureza em humildade e apagamento. Pelo contrário, o Espírito Santo, sem assumir outra natureza, marca sua presença com símbolos de estrépito e majestade. A face da terra será renovada por Ele, daí a manifestação do esplendor, força e rapidez dos fenômenos físicos que acompanharam sua infusão de graças nos que se encontravam reunidos no Cenáculo (conforme a 1ª leitura de hoje, At 2, 1-11), porque eles deveriam ser Apóstolos e testemunhas. Era preciso que fossem iluminados e protegidos, e soubessem ensinar. No Evangelho de João, essa doação do Espírito Santo tem em vista a faculdade de perdoar os pecados:

23 “Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados, àqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos.”

Que grande dom concedido aos mortais por meio dos sacerdotes: o perdão dos pecados! Por outro lado, que imensa responsabilidade a de um Ministro de Deus! Dele diz São João Crisóstomo: “Se o sacerdote tiver conduzido bem sua própria vida, mas não tiver cuidado com diligência da dos outros, condenar- se-á com os réprobos” (9).

III – CONCLUSÃO

Quanto se fala de paz, hoje em dia, e quanto se vive no extremo oposto dela! O interior dos corações se encontra penetrado de tédio, apreensão, medo, desânimo e frustração, quando não de orgulho, sensualidade e falta de pudor. A instituição da família vai se tornando uma peça de antiquário. A ânsia de obter, não importa por que meio, sem levar em conta o direito alheio, vai caracterizando todas as nações dos últimos tempos. Em síntese, não há paz individual, nem familiar, nem no interior das nações.

Eis porque nossos olhos devem voltar- se à Rainha da Paz a fim de rogar sua poderosa intercessão para que seu Divino Filho nos envie uma nova Pentecostes e seja, assim, renovada a face da terra, como melhor solução para o grande caos contemporâneo. (Revista Arautos do Evangelho, Maio/2005, n. 41, p. 6 à 11)

Por Monsenhor João Clá Dias, EP

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