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Tempestade no mar

Redação (Sexta-feira, 26-10-2018, Gaudium Press) Certo dia, ao cair da tarde, Jesus foi até o Mar de Tiberíades e ordenou a seus discípulos que tomassem um barco e O conduzissem até à margem oposta. As águas estavam tranquilas, mas de repente desencadeou-se uma terrível tempestade.

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Aquele a quem até o vento e o mar obedecem

Eis como São Marcos narra o acontecido:

“Começou a soprar uma ventania muito forte e as ondas se lançavam dentro da barca, de modo que a barca já começava a se encher. Jesus estava na parte de trás, dormindo sobre um travesseiro. Os discípulos O acordaram e disseram: ‘Mestre, estamos perecendo e Tu não Te importas?’

“Ele Se levantou e ordenou ao vento e ao mar: ‘Silêncio! Cala-te!’ O vento cessou e houve uma grande calmaria. Então Jesus perguntou aos discípulos: ‘Por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?’ Eles sentiram grande medo e diziam uns aos outros: ‘Quem é este, a quem até o vento e o mar obedecem?'” (Mc 4, 37-41).

Esse mar tem 12 km de largura e 21 km de comprimento, e em suas margens “se encontra a famosa cidade de Magdala, na qual Maria, irmã de Lázaro, decaíra moralmente. Ali viveu durante anos, num castelo à beira das águas, antiga propriedade de sua família”. Por essa razão ela foi cognominada Madalena.

Semelhante a um fogoso corcel ferido pelo chicote

“Situado a mais de 200 metros abaixo do nível do Mediterrâneo, e como que apertado de quase todos os lados por um cinturão de montes, [o Mar da Galileia] recebe sobre sua lisa superfície os ventos que se precipitam do alto do Hermon. Sob este duro golpe suas águas se revoltam e saltam como fogoso corcel ferido pelo chicote. Foi o que se passou neste dia em que os Apóstolos, ao deixarem a pequena enseada, viram as águas muito tranquilas, sem notar o menor indício de tormenta próxima.

“Jesus aproveitou esta tranquilidade para descansar das fadigas do dia. Estendeu-Se na popa, apoiando a cabeça, como nota Marcos (cf. Mc 4, 38), sobre o travesseiro, provavelmente um saquinho de couro cheio de lã, simples e tosco […]

“Como os Anjos do Céu deveriam estar contemplando seu Rei e Senhor deitado sobre a dura madeira: restaurando suas forças com o sono, Aquele que vigia desde toda a eternidade; vencido pela fadiga, Aquele que move com seu dedo o universo inteiro!

“De súbito, desenhou-se no rosto dos Apóstolos um movimento de inquietação; interrompeu-se a conversa, fixaram-se as vistas no horizonte: sua longa experiência lhes fazia pressentir uma borrasca. E ela se precipitou, desde logo com um ímpeto formidável. “

Essa tempestade não surgiu por acaso, pois Deus é o Senhor do universo. Diz o salmista: “Pela palavra do Senhor foram feitos os céus, e pelo sopro de sua boca todo o seu exército. Ele junta as águas do mar como num odre, e em reservatórios encerra as ondas” (Sl 32, 6-7).

Simbolismo da tempestade

Essa borrasca é muito simbólica. Todos os homens, bons ou maus, passam por grandes dificuldades que se assemelham a tempestades. Entretanto, a disposição de alma de uns e de outros é oposta, conforme afirma Santo Agostinho neste trecho que mostra o voo de seu pensamento:

“Apesar de [os justos e os maus] sofrerem o mesmo tormento, virtude e vício não são a mesma coisa. Assim como com um mesmo fogo o ouro resplandece e a palha fumega, com o mesmo debulhador se tritura a palha e se limpa o grão, e não se confunde o resíduo da azeitona com o azeite por terem sido prensados com o mesmo peso, assim também uma mesma adversidade prova, purifica e aprimora os bons, enquanto reprova, destrói e aniquila os maus.

“Por conseguinte, em idêntica dificuldade, os maus abominam a Deus e blasfemam contra Ele, e os bons O glorificam e suplicam misericórdia. Eis aqui a importância da qualidade, não dos tormentos, mas dos atormentados.

Agitados com igual movimento, o lodo expele um odor repelente e o unguento, uma suave fragrância.”

Também a Igreja passou por tempestades.

“Ora foram perseguições declaradas e cruentas, ora silenciosas e hipócritas. Ódios mortais e ingratidões históricas vincaram o curso das heresias e dos cismas.

“Entretanto, a Igreja nunca duvidou d’Aquele que vela por seu imortal destino. E ainda quando Ele parece dormir, faz ecoar no interior dos fiéis sua infalível promessa: ‘Ecce ego vobiscum sum omnibus diebus usque ad consummationem sæculi – Eu estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos’ (Mt 28, 20).”

Mais forte, mais jovem e com beleza invariavelmente acrescida

Mas essas borrascas continuam. Eis o que afirmou João Paulo II, em 1981:

“Os cristãos hoje, em grande parte, sentem-se perdidos, confusos, perplexos e até desiludidos […] Foram difundidas verdadeiras e próprias heresias, no campo dogmático e moral.”

Quatro anos depois, o Cardeal Joseph Ratzinger, então Prefeito da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, declarou:

“Os resultados que se seguiram ao Concílio [Vaticano II] parecem cruelmente opostos às expectativas de todos […] Os Papas e os Padres conciliares esperavam uma nova unidade católica e, pelo contrário, se caminhou para uma dissensão que – para usar as palavras de Paulo VI – pareceu passar da autocrítica à autodemolição […] Esperava-se um salto para a frente e, em vez disso, encontramo-nos ante um processo de decadência progressiva.”

A Igreja pode ser comparada a uma barca. “Mesmo em meio aos mais terríveis perigos, [ela] jamais vai ao fundo. Pelo contrário, como que ressurge sempre mais forte, mais jovem e com beleza invariavelmente acrescida. A cada ameaça, sua glória se eleva, por ser inquebrantável sua fé.

“Quão grande bênção e que incomensurável graça sermos filhos da Igreja!”

Por Paulo Francisco Martos
(in “Noções de História Sagrada” – 169)

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1 – CLÁ DIAS, João Scognamiglio. EP. O inédito sobre os Evangelhos. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana; São Paulo: Instituto Lumen Sapientiae, 2014, v. IV, p.177.
2 – FERNÁNDEZ TRUYOLS, SJ, Andrés. Vida de Nuestro Señor Jesucristo. 2.ed. Madrid: BAC, 1954, p.316-317.
3 – A Cidade de Deus. Livro I, capítulo 8, n.2
4 – CLÁ DIAS, op. cit., p. 191.
5 – Alocução de 6-2-1981 aos Religiosos e Sacerdotes participantes do I Congresso Nacional Italiano sobre o tema “Missões ao Povo para os Anos 80”, in “L’Osservatore Romano”, 7-2-1981.
6 – Cf. MESSORI, Vittorio. A coloquio con il cardinale Ratzinger, Rapporto sulla fede. Milano: Edizioni Pauline. 1985, p. 27-28).

 

 

 

 

 

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